IPH - Instituto de Pesquisas Hospitalares

Publicações Revista IPH Especial 60 Anos Conforto Acústico em Ambientes de Saúde: Música, Paisagismo e Materiais de Revestimento como Soluções Humanizadoras

Conforto Acústico em Ambientes de Saúde: Música, Paisagismo e Materiais de Revestimento como Soluções Humanizadoras Fábio Bitencourt

Introdução

Em edificações para serviços de saúde, onde é frequente a ocorrência de situações críticas e estressantes, envolvendo relações interpessoais e indivíduos com algum grau de sofrimento físico e/ou psíquico, os fatores ambientais que definem as condições de conforto (acústica, visual, higrotérmica e ergonômica) assumem responsabilidades significativas durante o desenvolvimento da concepção arquitetônica.

O presente trabalho é uma revisão bibliográfica narrativa que visa descrever e discutir as questões relativas ao conforto acústico, vinculando-o às responsabilidades projetuais arquitetônicas que possibilitem melhores resultados assistenciais para os serviços de saúde (ROTHER, 2007; POPE, 2005). Destacam-se os aspectos conceituais do ruído e os consequentes riscos à saúde, a utilização do paisagismo, da música e dos materiais de revestimento e sua aplicação no projeto arquitetônico, considerando os riscos e agravos à saúde que os justificam como fatores essenciais ao conforto humano.

O ambiente hospitalar vive a paradoxal situação de ser simultaneamente um local que exige condições de conforto acústico especiais, com níveis de ruído que atendam às recomendações estabelecidas pelas normas técnicas e, por outro lado, ser também, um local com componentes situacionais e equipamentos que produzem condições extremamente ruidosas.

Um constante dilema funcional com demandas diversas e soluções envoltas em múltiplos aspectos físico-funcionais.

Atividades intelectuais e procedimentos terapêuticos que exijam atenção para aplicação dos seus processos necessitam de concentração e, portanto, ambientes ruidosos podem interferir diretamente tanto na qualidade do diagnóstico quanto no processo terapêutico. Motivos técnicos e aspectos da saúde humana que justificam o importante interesse contemporâneo no assunto.

1 Desenvolvimento


1.1 Referências conceituais e projetuais

O arquiteto e engenheiro Jarbas Karman, escritor e pesquisador das questões do ambiente hospitalar, considerava que dentre os "vícios de origem" da construção dos estabelecimentos de saúde, os ruídos e as vibrações deixam poucas alternativas de soluções posteriores para a manutenção e a segurança. Ele caracteriza os locais e equipamentos prediais e especiais das instalações hospitalares como "agrupamento barulhento" e que requerem implantação específica com delimitações de localização adequadas (KARMAN, 2011, p. 78).

Figuras 1 - Florence Nightingale atende pacientes no Hospital Militar de Scutari, 1854. 
Fonte: Wellcome Library, V0004315.

De acordo com a enfermeira anglo-italiana Florence Nightingale, autora do livro Notes on Hospital, publicado em 1856, as questões dos cuidados terapêuticos com o paciente estavam intimamente vinculadas à qualidade do ambiente. Aspectos vinculados à iluminação zenital, disposição dos leitos para aproveitamento da ventilação natural e proteção acústica fariam parte da assistência. Para Florence o "ruído desnecessário é a mais cruel ausência de cuidado" (apud HOSKING, 1999, p.163).

Algumas pesquisas realizadas sobre "controle de ruídos em hospitais" em instituições da Inglaterra e publicadas pelo King'sFundReport demonstraram que para se conseguir conforto acústico "o fator mais simples a ser controlado é a disciplina sobre a equipe de profissionais de saúde" (HOSKING, 1999, p. 163/4). Campanhas para atenuação dos ruídos em ambientes de saúde são práticas recorrentes que devem ser incentivadas e não podem sofrer descontinuidade, conforme pode ser observado nas figuras 2 a 6. 

Figura 2 - Cartaz sobre o tema "Controle de ruídos em Hospitais", em uma campanha contra ruídos, elaborado por "Fougasse" (Cyril KenethBird) para o King's Fund.
Fonte: Hosking, 1999, p. 164.

As questões relacionadas aos barulhos decorrentes da concepção projetual e da construção do edifício hospitalar podem determinar a existência de soluções complexas ou muitas vezes "mais um hospital doente", segundo Karman em suas avaliações sobre os vícios de origem dos hospitais (KARMAN, 2011, p. 79).

A compreensão do conforto acústico vincula-se diretamente ao entendimento e distinção do que seja ruído e seus impactos na saúde, segurança e bem-estar. Uma conceituação mais convencional, segundo diversos autores, define o ruído como um "som indesejável" ou "som desagradável" (NORD, 2012; BITENCOURT, 2011; IIDA, 2005; SOUZA, 2003; DOMENÈCH, 2002; BERNASCONI, 2001; GRANDJEAN, 1998).

De acordo com o pesquisador alemão e estudioso de acústica W. Hawell, "o som é incômodo quando ele não é percebido pela pessoa alvo como concordante com os interesses momentâneos desta pessoa" (GRANDJEAN, 1998, p. 263) e, portanto, pode ser classificado como um ruído, um som indesejável. Ou ainda, conforme definição apresentada pelo professor ItiroIida, "o ruído é um estímulo auditivo que não contém informações úteis para a tarefa em execução" (2005, p. 239).

Figuras 3, 4, 5 e 6 - Referências de cartazes de campanhas pelo silêncio em hospitais. Fonte: http://ihm.nlm.nih.gov (1943), 2014; HNSC, 2012.

A tolerância ao ruído é geralmente menor durante o período de adoecimento e "a exigência do silêncio em hospitais é uma das tradições mais antigas no cuidado com o doente" (HOSKING, 1999, p.163). Assim, o controle sobre os ruídos deve ser uma importante estratégia de qualidade do conforto para todos os usuários (profissionais de saúde, pacientes e visitantes), pois os ruídos estão sempre vinculados a uma relevante fonte de estresse.

1.2 O ruído e os agravos à saúde

Entender o fenômeno som e como ele se propaga é fundamental para que se possa estabelecer as devidas barreiras e sistemas de proteção necessários à qualidade
Acústica exigida para o bem-estar humano. O nível de intensidade sonora (NIS) é definido a partir da potência do som e é expresso em decibéis (dB) em uma curva A, que reflete a mais próxima da audibilidade humana, e deve ser assim expresso dB(A). As unidades de ondas sonoras medidas em uma determinada escala de tempo são definidas como frequências sonoras e expressas em Hertz (Hz) (ABRAHÃO, 2009; IIDA, 2005; SOUZA, 2003; GRANDJEAN,1998).

Para a melhor compreensão do impacto acústico nos ambientes onde são realizados serviços de assistência à saúde é fundamental o entendimento do conceito dos ruídos gerados por fontes sonoras interferentes. Tais ruídos são definidos pela Norma Técnica Brasileira - NBR 12179, como "de ocorrência alheia, ou temporária, em relação à finalidade mais característica de utilização do recinto em que se avalia o ruído ambiente" (2003, p. 2). Levando-se em conta que quaisquer ruídos de ocorrência alheia ou temporária podem ter impacto na qualidade do conforto humano dos usuários de edificações para serviços de saúde, eles devem ser inseridos na caracterização do ruído a ser considerado, medido e efetivamente incluído na avaliação acústica com vistas ao seu controle.
 
Figura 7- Limiar da audição e da dor em relação ao nível de intensidade do som (dB [A]) e da frequência sonora (Hz). Fonte: WOODSON, 1992.

Ao mesmo tempo, a relevância do impacto dos ruídos nas atividades realizadas em estabelecimentos assistenciais de saúde (EAS), por serem eles frequentemente recorrentes, evidencia que devam ser considerados como interferentes na percepção do conforto humano relativo à acústica. O sinal sonoro de telefones fixos e celulares, os ruídos provenientes de carrinhos com material da enfermagem, as conversas entre os profissionais de saúde, o sinal sonoro de monitores, bem como demais referenciais sonoros produzidos pelos equipamentos médico-hospitalares devem ser considerados como parte integrante do conjunto de ruídos produzidos nos ambientes de saúde (SOUZA, 2003; BERNASCONI, 2001).

Com efeito, decorrente das características dos ruídos identificados como inerentes ao ambiente e à realização das atividades funcionais, pode-se inferir que tais sons sejam inerentes e não interferentes, ou fontes sonoras interferentes como definido na NBR 12179 (ABNT, 1992).

Nos ambientes de saúde e especificamente nos centros obstétricos, as atividades inerentes ao nascimento fazem com que a mulher, em razão das dores provenientes do trabalho de parto, possa produzir sons, gemidos e gritos, com níveis de pressão sonora que soem incômodo aos profissionais de saúde responsáveis pelos procedimentos obstétricos. Nível de Pressão Sonora (PA) que pode ser entendido como a representação da medida das oscilações de pressão que se movem em determinada faixa de frequência e intensidade e que podem ser percebidas pelo ouvido humano, ou conforme IIDA (1997, p.240) a "intensidade de uma sensação sonora".

Para o médico e professor J. C. Yoder, da Pritzker Escola de Medicina da Universidade de Chicago, os ruídos produzidos em ambientes hospitalares colocam os pacientes em condições de risco. Ele recomenda que "hospitais deveriam implementar intervenções para reduzir os ruídos noturnos em um esforço para promover a satisfação e a recuperação do paciente, pois reduzir ruídos pode ser uma forma simples de adotar hábitos cuidadosos" (YODER, 2012, p.1). Alguns procedimentos recomendados em seu trabalho orientam a enfermagem às seguintes práticas:
  1. perguntar aos pacientes sobre o melhor horário para realizar a higiene e hábitos pessoais;
  2. manter portas fechadas e iluminação da circulação reduzida com intensidade suficiente para permitir as atividades noturnas;
  3. recomendar a redução de conversas de grupos na área de circulação.


1.3 A paisagem e o silêncio

A utilização de soluções paisagísticas pode ser uma alternativa importante na abordagem do cuidado com a prevenção, controle e redução dos ruídos. Quando implantadas em locais com urbanização periférica que vierem a ficar  ruidosos após a construção da unidade hospitalar, as soluções paisagísticas podem apresentar resultados positivos amenizando o som do trânsito, ao mesmo tempo em que transferem melhorias climáticas e tornam o ambiente mais humano (NORD, 2012, 2009; ULRICH, 2001, 2002; DOMENÈCH, 2002).

Figura 8 - Implantação privilegiando a proteção paisagística e acústica no entorno do Haga Hospital (930 leitos), Haia, Holanda - The Volker Wessels Haga Consortium. Fonte: http://www.heartbeat5.nl/facilities.asp-Service=Haga%20Hospital&ID=4, 2014.

O arquiteto e pesquisador Francesc Daumal i Domènech, da Universidade da Catalunha, Espanha, defende a relevância da arborização no entorno da edificação como importante promotor do conforto acústico na medida em que "somente o fato de tapar a visão do veículo, psicologicamente o usuário deste território percebe como menor a chegada da energia sonora" (2002, p.157).

Um som que não desejamos pode ser perfeitamente amenizado pela ambientação paisagística e pelos resultados que a arborização, decorrente de sua densidade, pode estabelecer como barreira. Domenèch destaca também que a imagem de uma "montanha pelada" remete à ausência de vida vegetal e, portanto, sequer é necessário dizer o quanto um "bosque muito denso contribui para a verdadeira barreira acústica que amortece perfeitamente o som que poderia invadir o território" (2002, p.157).

A abordagem sobre paisagismo e controle de ruídos é tratada com destaque nas normas técnicas para edificações de saúde do Reino Unido, Health Technical Memorandum 08- 01: Acoustics, que recomenda no item 2 os Critérios Acústicos em que o projeto deve estar baseado em relação aos níveis de ruído que levem em conta a possibilidade de mudanças no ambiente e no seu entorno imediato. E cita exemplos como a possibilidade do local atrair ou não atrair tráfego intenso de carros e, consequentemente aumentar o nível dos ruídos. O projeto, portanto, deve predizer os problemas acústicos e adotar as medidas preventivas, antecipadoras dos impactos decorrentes, como práticas razoáveis e necessárias ao conforto humano (DEPARTMENT OF HEALTH UNITED KINGDOM, 2006, p. 2).

Figura 9 - Recomendações sobre a abertura de portas com vistas à proteção e redução de ruídos por vizinhança e contato com ambientes ruidosos. Fonte: DEPARTMENT OF HEALTH UNITED KINGDOM, 2006, p. 12.


O referido documento oficial - Health Technical Memorandum 08-01: Acoustics -   recomenda também controles e cuidados na concepção do projeto a partir de cuidados simples para áreas que exijam privacidade e silêncio no contato entre o profissional de saúde e o paciente: consultórios, salas de entrevistas e acolhimento. Soluções arquitetônicas recomendadas podem ser o cuidado com a abertura de portas para áreas ruidosas, criação de anteparos paisagísticos atenuadores de ruídos, conforme Figura 8.

1.4 A música e o conforto

Outra abordagem importante refere-se à utilização da música em ambientes de saúde. Não é um assunto que apresente consenso em relação à sua utilização, embora haja importantes referências sobre a sua utilização em áreas ou ambientes em que a utilização do som musical possa ser opcionalmente definida como escolha ou estratégia (KARMAN, 2011; FGI, 2010; NORD, 2009; ROBERTSON, 2001; HOSKING, 1999). No entanto, há evidências científicas de metodologias inovadoras e complementares às convencionais que apontam a "música numa perspectiva de um cuidar multidimensional" (ARAÚJO, 2013, p. 1319).

Alguns estudos apresentados por Carpmann e Grant em Design that Cares(1993) e complementados por Romano Del Nord (2012, 2009), Roger Ulrich (2002, 2001), Paul Robertson (2001), Sarah Hosking (1999) e outros pesquisadores (ARAÚJO, 2013; PUGGINA, 2009; KARMAN, 2011; BITENCOURT, 2003) recomendam a utilização da música como "audioanalgésico", sobretudo para auxiliar a relaxar durante procedimentos médicos e odontológicos.

A partir do final do século XX, o Ministério da Saúde estabeleceu estratégias importantes de conforto na Política Nacional de Humanização da Atenção e Gestão no Sistema Único de Saúde - HumanizaSUS. Dentre as recomendações para ambiências humanizadas, o ruído tem abordagem destacada, e propõe-se "a utilização de música ambiente em alguns espaços como enfermarias e esperas. Em outro âmbito, é importante considerar também a proteção acústica que garanta a privacidade e, controle, de alguns ruídos" (BRASIL, 2010, p. 122).

Uma medida de humanização para os pacientes internados refere-se ao uso da música de modo individual, utilizando fones de ouvidos descartáveis. Solução para o  conforto aos pacientes recomendada por estudos científicos e por profissionais que lidam com o componente de conforto acústico. Essa medida tem apresentado resultados "que podem regular o humor, reduzir a agressividade e a depressão" justificada porque o "processo de audição musical afeta de forma positiva a liberação de substâncias químicas cerebrais" (ARAÚJO, 2013, p. 1319).

Os fones também podem contribuir para 'mascarar conversas', sinais ruidosos como 'bipes' de respirador, de cintilador, de bomba de ventilação e outros ruídos que "atemorizam os pacientes durante o pré-operatório e em UTIs". A sua utilização funciona como um alerta apresentado pela observação: 

O fone de ouvido permite adotar critérios únicos para cada paciente. O critério preferência é muito interessante, porém, os mesmos cuidados devem ser tomados quanto ao ritmo e à letra das músicas escolhidas (PUGGINA, 2009, p. 29).

Outras alternativas e medidas para reduzir os níveis de ruído nas UTIs e demais ambientes hospitalares podem ser utilizadas com seguintes estratégias:
  • substituição dos alarmes acústicos por visuais;
  • criação de distintas categorias de alarmes, para distinguir os eventos de ameaça à vida das intercorrências de rotina;
  • analise periódica do perfil acústico dos ambientes de permanência de pacientes e profissionais de saúde;
  • revisão do impacto acústico dos equipamentos utilizados;
  • divulgar os achados de pesquisa sobre o assunto, conscientizando a equipe profissional a respeito dos possíveis efeitos auditivos, fisiológicos e emocionais da exposição a níveis elevados de ruído (PUGGINA, 2009, p. 33)


1.5 Materiais de revestimento: conflito iminente

As estratégias de atenuação dos ruídos no ambiente hospitalar encontram uma dificuldade suplementar no que se refere aos materiais que possuam boa qualidade de absorção acústica. A constituição molecular desses materiais contrapõe-se às exigências de controle de higienização e, em consequência, ao controle de infecções hospitalares na medida em que "as armadilhas para captar o som, servem igualmente como refúgio extremamente apreciado pelos micro-organismos" (SERAQUI, 1998, p.101).

Os arquitetos Flávio Bicalho e Regina Barcellos, no texto "Materiais de acabamento em estabelecimentos assistenciais de saúde" (CARVALHO, 2002, p. 47), apontam a reflexão dos sons como um dos aspectos relevantes a serem observados na escolha dos pisos em ambientes hospitalares. Essa escolha visa resguardar o conforto do paciente e dos demais usuários, sobretudo nos quartos de internação, UTIs e nas circulações secundárias, próximas a quartos e salas de exames.

Os revestimentos vinílicos flexíveis heterogêneos ou linóleos, disponíveis em mantas, compostos de resinas de PVC, pigmentos, fibra de vidro e plastificantes, utilizados para pisos, aparecem atualmente como os mais recomendáveis materiais existentes. Segundo os arquitetos anteriormente referidos, as suas características físicas de homogeneidade e de fácil aplicação, "permitem uma boa limpeza, pois as juntas são soldadas no local e ficam perfeitamente integradas no piso, formando um bloco monolítico, além de permitirem a confecção do rodapé contínuo" (CARVALHO, 2002, p. 63).

Publicada em 2010, a mais recente revisão da norma técnica norte-americana para projetos e construção de ambientes de saúde, Guidelines for Design and Construction of Hospital and Health Care Facilities, coordenada e produzida pelo The Facility Guidelines Institute, edição 2010, recomenda alguns critérios e observações para implantação de unidades hospitalares em função dos ruídos. Tal referência utiliza também a hierarquia dos estabelecimentos assistenciais de saúde, considerando o impacto de ruídos dos espaços exteriores. (FGI, 2010, p. 37).

 
Tabela 1 - Afastamentos e distâncias mínimas a extremos desde o hospital até as fontes de ruídos. Fonte: FGI, USA, 2010.

Da mesma forma, a Tabela 2 apresenta critérios de projetos para Mínimos-Máximos de Ruídos em Espaços Interiores de Ambientes de Saúde1 (FGI, 2010).

Tabela 2 - Critérios de projetos para Mínimos-Máximos de Ruídos em Espaços Interiores de Ambientes de Saúde. Fonte: FGI, USA, 2010.

Notas:
  1. O Coeficiente de Redução de Ruídos (NRC) ou Nível de Redução de Ruídos (NC) deverá ser utilizado para estimar o coeficiente médio de absorção de som por ambiente segundo as estimativas da Tabela 2.
  2. Um sistema de classificação deve ser escolhido para avaliar os níveis de ruído por ambiente e ruídos provenientes de sistemas mecânicos da edificação devem ser considerados a partir desse sistema de classificação.

Alguns ruídos específicos localizados em estabelecimentos de assistência à saúde são fontes significativas de desconforto para muitos pacientes, além de o serem também para os próprios profissionais que lidam diretamente com as atividades assistenciais. Geralmente, sobre esses ruídos pouco se tem controle, provocando assim, uma situaçãocom representativo valor de desconforto humano no ambiente hospitalar.

Embora existam recomendações técnicas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) e também a legislação brasileira contenha diversas recomendações de procedimentos fixando condições de aceitabilidade do ruído em ambientes de saúde, há especificidades que não estão plenamente contempladas.

A Norma Brasileira da ABNT, NBR 10151 - Acústica - Avaliação do ruído em áreas habitadas, visando ao conforto da comunidade - Procedimento, publicada em junho de 2003 e que incorpora a Errata de 1º de junho de 2003, embora seja a norma mais atual não apresenta a especificidade necessária à contemporaneidade do problema para ambientes de saúde.

Apenas na Tabela 3 - Nível de Critério de Avaliação NCA para ambientes externos em dB(A) da NBR 10151 são fixadas "as condições exigíveis para avaliação da aceitabilidadedo ruído em comunidades, independente da existência de reclamações" (ABNT, 2003,p.10).

Tabela 3 - Nível de critério de avaliação NCA para ambientes externos, em dB(A). Fonte: ABNTNBR 10151, 2003.

Na Norma Brasileira da ABNT, NBR 10152 Acústica - Avaliação do ruído ambiente em recintos de edificações visando ao conforto dos usuários - Procedimento, são caracterizados alguns ambientes de estabelecimentos de saúde e respectivos valores de ruído aceitáveis baseados em níveis sonoros dB (A) e nas "curvas de avaliação de ruídos,através dos quais um espectro sonoro pode ser comparado, permitindo uma identificação de bandas de frequência mais significativas e que necessitam correção" (ABNT, 1992, p.3). Essas informações estão referidas na Tabela 4 - Valores dB(A) e NC apresentadas a seguir.

Tabela 4 - Valores dB(A) e NC. Fonte: ABNT, NBR 1012, 1992.

Notas:
a) O valor inferior da faixa representa o nível sonoro para conforto, enquanto que o valor superior significa o nível sonoro aceitável para a finalidade.
b) Níveis superiores aos estabelecidos nesta Tabela são considerados de desconforto, sem necessariamente implicar risco de dano à saúde.

Os materiais que funcionam como isolantes sonoros e que têm aplicação em ambientes hospitalares estão mais diretamente referenciados às necessidades de revestimento dos pisos para edificações hospitalares, sobretudo em áreas de internação, circulações, consultórios e unidades de terapia intensiva. Para as salas cirúrgicas, salas de procedimentos hemodinâmicos e salas de parto devem ser consideradas as exigências de utilização da proteção condutiva e respectivo aterramento.

A instalação desse material - piso condutivo - visa à redução de cargas eletrostáticas que possam atingir o paciente, assim como os profissionais que estejam atuando no ambiente. Além do risco de explosão, pois com a baixa umidade relativa do ar em razão da utilização do sistema de climatização "e onde se usam anestésicos ou materiais químicos de limpeza, há o risco que uma explosão seja deflagrada por descargas eletrostáticas, além de outras causas como a possibilidade do choque elétrico em pacientes em função dessas descargas" (BICALHO, 2010, p.80).

Os materiais de revestimento, embora devam considerar a sua função de absorção acústica, devem respeitar as exigências de controle de assepsia das superfícies e respectivos aspectos de controle de infecção. Um importante alerta sobre o assunto é apresentado pelo arquiteto Flávio Bicalho: "tanto nas áreas criticas quanto nas semicríticas, devem ser sempre utilizados materiais de acabamento que tornem as superfícies lisas, monolíticas de preferência, ou com o menor número possível de ranhuras ou frestas. Estes materiais devem garantir a manutenção de suas características mesmo após o uso intenso e limpeza frequente" (2010, p. 67).

Para as áreas molhadas que não exijam conforto acústico com a precisão apresentada, podem ser adotados revestimentos com materiais de alta resistência, desde que atendam às recomendações de apresentarem índice de absorção compatível com as necessidades da Resolução RDC nº 50/2002.

Os materiais, cerâmicos ou não, quando usados nas áreas críticas, não podem possuir índice de absorção de água superior a 4% individualmente ou depois de instalados no ambiente, além do que, o rejunte de suas peças, quando existir, também deve ser de material com esse mesmo índice de absorção. O uso de cimento em qualquer aditivo antiabsorvente para rejunte de peças cerâmicas ou similares é vedado tanto nas paredes quanto nos pisos das áreas críticas (BRASIL, 2002, p.107).

Os materiais para revestimento do teto podem ser importantes auxiliares na qualidade do conforto acústico nos ambientes de saúde. Quanto à sua instalação eles podem ser fixos ou removíveis e para cada um deles, há fatores a se considerar sob o aspecto da contribuição para redução dos ruídos. Para quaisquer das situações de criticidade do ambiente em relação à possibilidade de transmissão de doenças (critico, semicrítico e não crítico), deve-se levar em conta a função de prevenção e controle de infecção a partir das recomendações de assepsia e limpeza, pois de acordo com a RDC nº 50 "os materiais adequados para o revestimento de paredes, pisos e tetos de ambientes de áreas críticas e semicríticas devem ser resistentes à lavagem e ao uso de desinfetantes" (BRASIL, 2002, p. 107).

Para ambientes onde sejam realizados procedimentos críticos (salas cirúrgicas, manipulação de nutrição enteral, quimioterápicos, procedimentos hemodinâmicos, área de leitos de UTI ou CTQ e áreas similares), os tetos "devem ser contínuos, sendo proibido o uso de forros falsos removíveis, do tipo que interfira na assepsia dos ambientes. Nas demais se pode utilizar forro removível, inclusive por razões ligadas à manutenção, desde que nas áreas semicríticas esses sejam resistentes aos processos de limpeza, descontaminação e desinfecção" (BRASIL, 2002, p. 107).

  1. Tetos fixos - Lajes e forros de gesso contínuo ou corrido.
  2. Tetos removíveis - há diversos materiais e tipos: metálico, madeira, PVC ou revestido de PVC, papelão, papelão prensado.

Deve-se observar, no entanto o impacto de reverberação do som que cada um desses materiais pode produzir no ambiente, consequentemente, o desconforto acústico que podem gerar.

Aspectos projetuais a serem adotados especificamente para edificações destinadas a serviços de saúde podem ser definidos pelas recomendações a seguir:

  • Estabelecer a adequada seleção do terreno e a devida consideração sobre os aspectos ambientais que possam impactar no conforto acústico;
  • Avaliar o impacto das condições naturais, relevo, topografia e condições geológicas na implantação da edificação;
  • Escolher e definir a forma do edifício e sua relação com as demais edificações do entorno imediato;
  • Ordenar e distribuir os espaços internos, considerando fluxos e relações funcionais;
  • Estabelecer a distribuição espacial e adequação da forma interna da edificação;
  • Definir a utilização das soluções de construção que reduzam a transmissibilidade dos ruídos;
  • Definir e aplicar materiais que reduzam a reverberação e absorção dos ruídos;
  • Utilizar e aplicar detalhes construtivos que contribuam para a melhor qualidade acústica.


2 Comentários


O problema acústico é, inicialmente, de responsabilidade do profissional que concebe o ambiente, sob todo e qualquer aspecto que possa interferir na qualidade do serviço ou atividade que possa ser desenvolvida no referido ambiente. Assim sendo, a definição da forma e a aplicação dos materiais de revestimento devem contemplar soluções que atenuem o impacto do ruído, assim como possam evitar que equipamentos ruidosos ali instalados sejam promotores de eventuais desconfortos acústicos.

O presente trabalho não pretende esgotar o assunto, mas promover novas reflexões sobre a relevância do tema, ao mesmo tempo em que se propõe a promover a qualidade dos ambientes de saúde.

As referências de experiências projetuais e pesquisas relacionadas ao longo do trabalho visam, preliminarmente, oferecer novos campos de pesquisa e possibilidades de desenvolvimento técnico e científico nas edificações assistenciais de saúde.



3 Referências

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