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Publicações Revista IPH Revista IPH Nº19 Design para ambientes de saúde: como a neurociência aplicada à arquitetura pode contribuir para a saúde e o bem-estar dos seus usuários

Design para ambientes de saúde: como a neurociência aplicada à arquitetura pode contribuir para a saúde e o bem-estar dos seus usuários Arquiteta Patricia Paiva D?Alessandro


Nós passamos a maior parte do nosso tempo em ambientes construídos, e, muitas vezes, não temos a consciência de como ele pode impactar de forma positiva ou negativa a nossa qualidade de vida, a saúde física e a mental. 

Existem muitos estudos na área da neurociência que trazem evidências do impacto da arquitetura no nosso cérebro, por meio dos nossos sentidos. Os estímulos provocados pelo ambiente são captados pelas nossas células receptoras, que os levam até o nosso sistema nervoso, provocando as sensações, as emoções e os sentimentos que moldam nosso comportamento. 

Este trabalho tem como objetivo descrever os aspectos da neurociência com foco em ambientes de saúde por meio de pesquisas bibliográficas e aplicação em projetos de arquitetura. 

Esses aspectos são estratégias ambientais aplicadas, como biofilia, iluminação e conforto acústico, considerando os cinco sentidos como principal via de acesso ao nosso cérebro. Por meio dos estudos da neuroarquitetua, é possível projetar ambientes que podem melhorar o desempenho, o bem-estar, as relações sociais e a recuperação dos seus usuários.

Palavras-chave: neurociência, neuroarquitetura, cérebro, biofilia, sentidos, comportamento.

1. Introdução

A arquitetura, desde os seus primórdios, trouxe para a humanidade a noção de solidez e segurança almejada pela espécie humana já na época em que o homem vivia nas cavernas, sob toda sorte de intempéries. Por meio de seus feitos, impérios se projetaram e deixaram suas marcas; traços de um povo passaram a ser definidos e a ser reconhecidos como característicos de uma determinada cultura; a arte e o belo adquiriam outras proporções. Uma das únicas certezas mantidas no desenhar de toda sua evolução histórica foi a de que a arquitetura confere sua atenção e oferece seus serviços ao ser humano (CRIZEL, 2020, p. 34).

"Levar a arquitetura a sério, portanto, nos impõe algumas exigências singulares e exaustivas. Ela requer que estejamos abertos à ideia de que o ambiente em que vivemos nos afeta (BOTTON, 2006, p.25).

Villarouco (2021:9) traz reflexões sobre os espaços que habitamos e a quantidade de estímulos ambientais que recebemos e guiam nossas emoções, pensamentos e comportamentos. Elementos como luz, cor, som, natureza, textura e cheiro podem afetar o nosso bem-estar, muitas vezes, de forma inconsciente.

De acordo com a neurocientista Tieppo, (2019, p.1), o cérebro controla todos os aspectos da vida humana, e fica cada vez mais claro que tudo o que vemos, ouvimos, cheiramos, digerimos, falamos, sentimos e pensamos depende de como o cérebro reage. Inclusive como agimos e nos comportamos, nossas crenças, memórias e desejos, nossa motivação e até nossa própria identidade.

Por essa lógica, a arquitetura pode influenciar como o cérebro reage aos estímulos provocados no ambiente construído. Segundo Eberhard (2009, p.753), a maioria dos neurocientistas pensa que a arquitetura é uma profissão preocupada com beleza e estética, que percebemos pelo sistema visual, da harmonia, da simetria e das proporções. Mas arquitetura é mais do que estética, ela precisa atender às necessidades funcionais dos usuários, ter elementos como iluminação e ventilação naturais. Ele sugere que salas de aula devem proporcionar atividades cognitivas, quartos de internação devem auxiliar na recuperação do paciente e que ambientes de trabalho devem ser mais produtivos.

Nanda (2005, p.164) descreve que um bom ambiente sensorial não é aquele que desperta todos os sentidos intensamente, mas que proporciona uma sintonia entre eles, ou seja, não se trata de estética e aparência, mas, sim, de estética da experiência. O nosso sistema nervoso é quem processa os estímulos recebidos a todo instante, tais como: o som do vento, a rua movimentada, os pássaros, a conversa dos colegas de trabalho, os carros que passam na rua, o cheiro de café ou de alguém fumando, o gosto doce de um brigadeiro, as cores, o frio ou o calor.

Muitas vezes, não conseguimos perceber esses estímulos de forma consciente. Levitin (2015, p.37) descreve como o cérebro humano evoluiu para esconder de nós certas coisas nas quais não prestamos atenção. Existe em nós um ponto cego cognitivo, onde o cérebro ignora completamente aquilo que não representa prioridade naquele momento, mesmo que esteja na frente dos nossos olhos. Segundo ele, os psicólogos cognitivos chamam esse ponto cego de cegueira por desatenção.

Nesse sentido, conhecer e aplicar a neurociência à arquitetura, comumente chamado de neuroarquitetura, auxilia na construção de ambientes mais eficientes no seu propósito, promovendo bem-estar aos seus usuários. 

2. Método

Este trabalho caracteriza-se como de natureza descritiva e pesquisa bibliográfica sobre neurociência e sua aplicação a projetos de arquitetura em ambientes de saúde. A metodologia utilizada foi pesquisa de artigos científicos na internet, em sites especializados, como o Google acadêmico, o Scielo, entre outros, de normas técnicas e de livros publicados relacionados ao tema. A coleta de dados baseou-se em: identificação do título, referência teórica, aplicação e resultados.

Assim, objetivou-se entender como o nosso sistema nervoso funciona e como podemos, por meio dos estudos da neurociência, projetar espaços que possam contribuir para o bem-estar e a qualidade de vida das pessoas em ambientes de saúde, como os hospitais. O resultado da pesquisa visa a despertar novos olhares em relação ao modo de projetar, com foco na experiência do usuário, seja ele paciente, seja acompanhante, seja funcionário. A pesquisa focou conhecer o nosso sistema nervoso e aplicar estratégias ambientais, como: biofilia, iluminação e conforto acústico, considerando os cinco sentidos. Visou-se, assim, a estabelecer uma abordagem multidisciplinar dos campos da medicina, biologia, arquitetura, entre outros.

3. Compreendendo o sistema nervoso

Na década de 90, tivemos um grande avanço no conhecimento do funcionamento do sistema nervoso humano. De acordo com Tieppo (2019, p.28), essa foi a década do cérebro, pois as neuroimagens obtidas por ressonância magnética, tomografia e outros equipamentos auxiliaram no aprofundamento dos conhecimentos sobre o cérebro.

Segundo Preuss (2014, p.1), os humanos possuem habilidades cognitivas muito diferentes das de outras criaturas, graças a uma série de características incomuns de nosso cérebro, como, por exemplo, o fato de pesar, em média, 1,3 kg, o que é muito grande para o nosso corpo. A maior parte dessa diferença no tamanho do cérebro se dá à expansão evolutiva do córtex, uma região que executa funções cognitivas sofisticadas, como linguagem, consciência e solução de problemas. O tamanho do córtex é parte do que torna o homem diferente dos outros animais.

De acordo com o material publicado na área de brain anatomy and function, do portal BrainFacts.org (2012, p.1), o sistema nervoso é divido em duas partes: sistema nervoso central e sistema nervoso periférico. Ambas trabalham juntas para o corpo comunicar adequadamente as sensações e suas necessidades. O sistema nervoso central é formado pelo encéfalo e pela medula espinhal. O encéfalo fica dentro do crânio, e a medula espinhal é protegida pela coluna vertebral. O sistema nervoso periférico consiste em nervos que percorrem o corpo todo. O cérebro envia as mensagens pela medula espinhal aos nervos periféricos do corpo todo, além de servir para controlar os músculos e órgãos internos.O sistema nervoso periférico se subdivide em somático e visceral. O somático é composto de neurônios que conectam o sistema nervoso central às partes do corpo que interagem com o ambiente exterior. Já o visceral é composto por neurônios que conectam o sistema nervoso central aos órgãos internos.

O sistema nervoso periférico também se subdivide em duas partes: simpático e parassimpático. O sistema simpático dispende energia e recursos para os momentos de estresse e excitação; enquanto o parassimpático conserva energia e recursos durante o estado de relaxamento, como, por exemplo, no sono.

O sistema nervoso é um sistema de processamento de informações. São informações para lá e para cá a todo momento, feito carros se deslocando em grande velocidade em autoestradas. Através do sistema nervoso, recebemos informações sobre o ambiente externo ? por meio da visão, audição, tato, olfato, gustação ? e do ambiente interno, nosso interior ? como dor, posição do corpo, pensamentos, emoções, memórias, informações das vísceras. Assim, selecionamos, processamos e combinamos as informações, produzindo respostas a partir delas. Ou seja, o sistema nervoso recebe sinais do ambiente, de todas as partes do nosso corpo e dá uma reposta aos estímulos recebidos, produzindo uma ação, um movimento, um comportamento (TIEPPO, 2019, p. 111).

Em relação à percepção consciente do nosso cérebro do ambiente construído, pelos estímulos sensoriais, Paiva (2019, p.565) destaca que, para processar informações conscientemente, usamos menos de 1% da capacidade de processamento inconsciente, de acordo com Eagleman.

Portanto, a maioria dos estímulos afetará os indivíduos em um nível subconsciente. Embora as pessoas possam ser afetadas por estímulos, elas não estão necessariamente cientes do efeito.

Os indivíduos estão em constante interação ativa com muitos ambientes ao seu redor. Uma sala quente pode causar pessoas suarem, se sentirem desconfortáveis e incapazes de se concentrarem. Uma sala escura pode fazer as pessoas sentirem medo, ficarem alertas e incapazes de relaxar. Uma sala de aula bem-iluminada, com luz natural, pode ajudar os alunos a estar atentos à classe. O meio ambiente sempre afeta os indivíduos que o ocupam em algum nível. Essa interação pode ser chamada de arquitetura e relação individual. Os espaços podem mudar as pessoas (arquitetura e indivíduo), e as pessoas podem mudar os espaços (arquitetura individual). Portanto, essa relação é um caminho de mão dupla (PAIVA et al, 2019, p. 565).

Com base nos conhecimentos da neurociência e da aplicação à arquitetura, o termo ?neuroarquitetura? vem sendo estudado com mais profundidade. Acredita-se que o início da neurociência aplicada à arquitetura, de acordo com Carbone (2021, p.13), deu-se com os estudos de Fred Gage. Este neurocientista, em 1998, descobriu que o cérebro continuava a produzir hormônios na idade adulta, o que o levou a se interessar por como o ambiente influencia a estrutura e o funcionamento do nosso cérebro. Ao lado de John Eberhard e outros profissionais, Gage fundou a ANFA (Academia de Neurociência para a Arquitetura). Para ele, o design do espaço no século 21 precisa melhorar nosso bem-estar, aumentar o desempenho e reduzir o estresse e a fadiga nas cidades.

Em seguida, serão apresentadas estratégias ambientais fundamentadas no estudo da neurociência, que arquitetos e designers podem utilizar como ferramenta de projeto para enriquecer os ambientes, minimizar os efeitos negativos de curto e de longo prazo e potencializar os efeitos positivos. Serão apresentadas estratégias que estimulam os sentidos (visão, olfato, paladar, tato, audição), em correlação a temas como biofilia, iluminação, conforto acústico e a como podem ser aplicadas em ambientes de saúde de forma prática. Além disso, as estratégias serão demonstradas por meio de imagens de projetos em estudo e ambientes já construídos.
 

4. Estimulando os sentidos

Não se enxerga o mundo como ele é, mas sim como se aprendeu a ver. A percepção é então esse processo de colocar as informações dentro do que a memória permite reconhecer, unidas a fim de identificar situações de perigo, posicionamento espacial, reconhecimento de formas. Contudo, parte desse reconhecimento envolve preencher lacunas e reaproveitar padrões mais recorrentes, anulando certos elementos de variabilidade de informações nesse processo. Essa característica de funcionamento é o que favorece a existência de fenômenos cognitivos como a constância perceptiva e as ilusões perceptivas (VILLAROUCO et al, 2021, p. 50).

As informações recebidas dos ambientes variam, mas a percepção é a mesma. A luz natural, por exemplo, ao longo do dia, sofre variações de temperatura e de cor. Mas o que percebemos ao redor não sofre alteração.

Uma das funções do ambiente construído é promover emoção. ?Somos seres movidos, em grande parte, pela emoção [...] A emoção é como uma montanha-russa, nos deixa desgovernados, em certos momentos, mas também nos dá impulso. Somos seres emocionais.? (TIEPPO, 2019, p.167).

A neuroarquitetura, como estudo que busca também compreender a leitura espacial feita pelos usuários, para que assim possa conferir a esses uma melhor experiencia em relação aos ambientes projetados, nutrese do despertar de gatilhos mentais vinculados a sensações, emoções e comportamentos na sua busca por resultados. Saber acessar, naturalmente, esse desafiador e rico sistema de integrações humanas, tendo como objetivo conferir aos usuários experiências positivas diante do convívio com ambientes, torna as práticas projetuais eficientes em seu mais simbólico propósito: promover uma experiência empática a quem está inserido nessas especialidades (CRIZEL, 2020, p.42).

A parte do encéfalo que produz a emoção é o sistema límbico, ? Tieppo (2019, p.167) o define como o sistema emocional ?, que está presente em várias partes do encéfalo, processa estímulos e responde automaticamente a eles. Ele proporciona respostas rápidas às demandas ambientais. O sistema límbico foi desenvolvido ao longo do processo evolutivo para poder se antecipar a situações que demandem respostas rápidas, como fuga, ataque e sobrevivência. As situações de maior emoção ficam fortemente gravadas na memória, assim, o nosso sistema nervoso as reconhece e se antecipa às respostas.

Tieppo (2019, p.116) explica que para sentir uma informação, consciente ou inconscientemente, é preciso que os receptores sensoriais sejam ativados. Esse conjunto de receptores é chamado de sistema somestésico ou somatossensorial. A somestesia inclui os cinco sentidos do nosso corpo, tal como a temperatura ao se tocar uma superfície, a dor, a pressão e a propriocepção.

Tais citações mostram que o sistema nervoso é influenciado pelo ambiente, causando emoções e moldando o comportamento humano. Essas emoções são produzidas pelo sistema límbico, que recebe e processa as informações pelos sentidos: visão, audição, olfato, paladar e tato. A seguir é apresentada uma contextualização sobre como os sentidos são impactados pelo ambiente construído. 

4.1. Visão

?A visão é o sentido mais usado para entender o espaço em que se está. Ela pode influenciar como as informações captadas pelos demais sentidos serão interpretadas [...] não vemos o mundo apenas com nossos olhos, mas com nosso cérebro? (VILLAROUCO, 2021, p.101).

O sistema visual, conforme descreve Silva (2013, p.1), é composto pelos olhos e suas estruturas, como pálpebras, supercílios, músculos, aparelho lacrimal, e pelos nervos. A visão funciona pelo processamento dos dados recebidos pelo encéfalo, por intermédio dos receptores sensoriais ativados pela luz. No cérebro, essas informações são também armazenadas.

De acordo com Tieppo (2019, p.132), a visão tem receptores que respondem à luz, à energia e à energia eletromagnética. Esses receptores são chamados de fotorreceptores e ficam na retina, divididos em cones e bastonetes. Os cones são sensíveis a três espectros de luz (verde, vermelho e azul). Os bastonetes são sensíveis aos tons de preto e branco e ajudam a enxergar quando há menos luz.

O estímulo elétrico é levado para alguns locais do cérebro, segundo Villarouco (2021, p.106), sendo o primeiro destino o hipotálamo, responsável por regular o metabolismo do nosso corpo e a sincronização do relógio biológico, ou seja, o ciclo dia e noite. Neste momento, entra a função dos cones e bastonetes, citados anteriormente. No escuro, os bastonetes são acionados, e, com pouca luz, o organismo tende a sentir sonolência e falta de concentração, orientado pelo relógio biológico.

A luz natural e artificial são ótimos exemplos do impacto direto do ambiente físico na regulação metabólica [...] sem a percepção consciente do indivíduo. Através da luz, o cérebro sincroniza grande parte de sua operação com o mundo externo (o ritmo circadiano) para cobrir o período de 24 horas em que as atividades do ciclo biológico acontecem. A luz também regula ritmos fisiológicos e psicológicos, afetando diretamente a vigília e o sono, a secreção hormonal, a função celular e a expressão genética (CRIZEL, 2020, p.274).

A luz do sol é o exemplo de iluminação que respeita o ritmo biológico do corpo humano: de dia emite uma luz mais azulada e, conforme anoitece, uma luz mais amarelada.

Porém a sociedade moderna vive muito dentro de ambientes construídos com a influência da iluminação artificial, telas de computador e celular, provocando mudanças comportamentais importantes. Em ambientes onde o indivíduo não consegue ter noção do dia ou da noite, o relógio biológico perde o controle do sistema pelo qual é responsável, segundo Filho (2018, p. 30).

A luz vermelha ajuda a manter ou aumentar o nível de atividade mental sem suprimir a produção de melatonina, hormônio que regula o sono, diferentemente da azul. Outros estudos haviam mostrado que luzes azuladas podem reduzir a produção de melatonina, liberada pela glândula pineal, localizada na base do cérebro. A melatonina ajuda a regular o ritmo circadiano, variação de fenômenos como frequência cardíaca e sono que oscila em períodos de aproximadamente 24 horas. Mais luz azul e menos melatonina poderiam deixar o organismo mais vulnerável ao desenvolvimento de tumores, além de desregular o sono. Quem tem de permanecer acordado para trabalhar à noite pode sentir um pouco mais de sono sob luz vermelha, mas o organismo provavelmente sofrerá menos danos (FIORAVANTI, 2009, p.1).

Um estudo feito no Brigham and Women?s Hospital, em Boston, EUA, por Rahman et al (2014, p.1), voluntários foram testados com exposição a dois tipos de luz: azulada e esverdeada. Todos estavam com exames normais, tanto físicos quanto psicológicos, e exames oftalmológicos negativos para teste de daltonismo. Foram monitorados sete dias antes do teste, com período de sono de oito horas por dia, e não puderam consumir nenhum tipo de medicamento, suplemento, cafeína, álcool ou nicotina. Durante o teste, eles realizavam as suas atividades cotidianas de trabalho, durante seis horas e meia com uma luz azul acesa. Observou-se que, durante esse tempo, eles tinham maior concentração, atenção mais aguçada e ondas cerebrais que sugeriam que estavam em estado de alerta. Já a luz esverdeada não resultou em nenhuma diferença significativa. O que a pesquisa também traz é que a exposição à luz azul no período noturno aumenta o estado de alerta, mas suprime a produção de melatonina, hormônio produzido pelo nosso corpo e cuja principal função é regular o ciclo circadiano.

Aplicando este resultado aos ambientes de saúde, como os hospitais, que funcionam 24 horas, a luz azul durante o dia auxilia o corpo clínico a executar suas atividades em estado de alerta, foco e concentração. À noite, essa luz pode ser utilizada para manter os profissionais concentrados, porém deve-se ter o cuidado de não a usar em excesso, para não interferir no ciclo circadiano. Para o paciente, reduzir a quantidade de luz no corredor minimiza a interferência da luz dentro do quarto de internação ou no leito de UTI, evitando a interrupção da produção de melatonina do paciente durante o sono.

Em locais destinados à internação, onde o usuário pode permanecer por muitas horas ou dias, as boas condições de iluminação artificial e a visualização do ambiente externo podem trazer conforto, além da importante percepção ou orientação do tempo em face do ciclo circadiano. Para os ambientes de emergência, salas cirúrgicas, unidades de terapia intensiva e demais áreas críticas, a iluminação excessiva sobre o impacto visual pode resultar em desconfortos emocionais relevantes, produzindo irritação e estresse, emoções que reduzem a qualidade da assistência (ANVISA, 2014).

Portanto, é muito importante que se tenha iluminação natural, tanto para o paciente quanto para os profissionais da saúde. A iluminação artificial deve seguir parâmetros conforme normas e ser dimensionada para o tipo de ambiente e atividade a ser desenvolvida. Além disso, quando possível, deve ter dimerização para controlar a intensidade de luz.

De acordo com a norma ANVISA (2002), para ambientes como quartos de internação e leitos de Unidade de Terapia Intensiva, além de iluminação artificial direta e iluminação natural, é obrigatória a luz de vigília nas paredes, para orientação espacial durante a noite no percurso até o banheiro. Essa luz não pode influenciar o sono, nem a produção de melatonina. Portanto, não deve possuir espectro de luz azul, de acordo com o estudo acima citado. Pode-se ver, na imagem 1, uma iluminação instalada sobre rodapé, que fica acesa durante a noite e possibilita a identificação espacial do quarto, proporcionando segurança para o paciente ao levantar-se. No teto, a iluminação é dimerizável, sendo acesa na maior intensidade apenas durante o procedimento médico ou de enfermagem. O paciente e seu acompanhante têm autonomia para regular a intensidade de luz conforme suas necessidades.


Imagem 1. Quarto de internação. Fonte: Imagem produzida pela autora (2021).


Se alguns ambientes do hospital não possuírem iluminação natural, será possível instalar placas que simulem o céu, para que se tenha a noção de dia, como mostra a imagem 2. A noite, ao serem desligadas, a iluminação no ambiente muda a temperatura de cor: do azul para o amarelo, auxiliando na produção de melatonina.



Imagem 2. Posto de enfermagem. Fonte: Imagem produzida pela autora (2021).


Um outro ponto importante a ser abordado é o olhar para a natureza. Muitos estudos foram feitos relacionando o contato direto e indireto com a natureza para auxiliar na recuperação de pacientes.

As relações estabelecidas entre os seres humanos e a natureza fomentaram alterações significativas na percepção e representação dos elementos naturais ao longo do seu percurso evolutivo. As relações, inicialmente instigadas por instintos de sobrevivência, transpuseram-se para a dominação e o controle com o advento da agricultura. Contudo, as inovações tecnológicas decorrentes disso não extinguiram a necessidade da conexão entre elementos bióticos e abióticos condicionantes da homeostase dos ecossistemas, assim demandando, após curto período de afastamento ? correspondente a menos de 5% da existência humana ?, a retomada gradual de atitudes positivas vinculadas à natureza (ZANATTA, 2019, p. 950).

A relação do homem com a natureza é denominada biofilia. Este termo, cunhado e popularizado pelo biólogo Edward O. Wilson, em seu livro Biophilia, significa a tendência inata dos seres humanos (de qualquer idade, local e cultura) a desenvolver uma ligação emocional com a vida e os processos vivos (FONSECA, 2009, p. 602).

Os resultados sugerem que os indivíduos estressados se sentem significativamente melhor após a exposição a cenas da natureza, em vez de cenas urbanas sem elementos da natureza. Em comparação com as influências das cenas urbanas, o efeito saliente das exposições da natureza foi aumentar o Afeto Positivo - incluindo sentimentos de amizade afetuosa, lúdica e exaltação. O aumento no afeto positivo produzido pelas cenas da natureza é consistente com a descoberta de que as exposições da natureza também reduziram significativamente o Despertar do Medo (ULRICH, 2007, p. 17).

Conforme cita Gressler (2013, p. 489), Roger Ulrich realizou um estudo no Hospital da Pensilvânia, entre 1972 e 1981, em que pacientes com o mesmo quadro clínico foram submetidos à mesma cirurgia e colocados em leitos hospitalares para recuperação: metade em quartos com vista para a natureza e metade com vista para um muro de tijolo do prédio vizinho. Os pacientes com vista para a natureza tiveram menor tempo de internação pós-cirúrgica e utilizaram menos analgésicos. Os resultados dessa pesquisa sugerem que apenas um vislumbre da natureza pode possibilitar a recuperação do estresse.

Na imagem 3, o quarto de internação tem ampla janela e vista para uma área verde. Por isso, é muito importante escolher as faces dos edifícios que possibilitem quartos de internação com vista para a natureza e, quando não for possível, simulá-la com imagens em forma de quadros ou papel de parede.


Imagem 3. Vista da janela quarto de internação. Fonte: Imagem produzida pela autora (2021).

Ulrich (2002, p.1) descreve em seu artigo resultados de pesquisas sobre a redução do estresse quando em contato com a natureza durante cinco minutos. Pacientes expostos à natureza por períodos mais longos acalmam-se e apresentam melhora clínica, reduzindo a ingestão de analgésico e a diminuição do tempo de internação. Ele sugere que jardins terapêuticos em hospitais trazem, além dos benefícios citados anteriormente, momentos de fuga positiva dos ambientes clínicos estressantes. Um lugar que não só os pacientes possam desfrutar, mas também seus familiares e os profissionais da saúde.

A imagem 4 mostra a planta baixa do pilotis de um hospital, com galerias comerciais, lojas, restaurantes e áreas de convivência, além de um jardim terapêutico. São percursos para mobilidade onde as habilidades físicas do paciente são testadas e aprimoradas, com pontos de contemplação, ilhas de vegetação para criação de um microclima diferenciado e pontos de sombreamento.


Imagem 4. Galeria e jardim terapêutico de um hospital. Fonte: Imagem produzida pela autora (2021).

O hospital é uma edificação com áreas que precisam ser ?limpas?, por isso, não é possível a utilização de plantas naturais em muitos setores. Para incluir a natureza nesses ambientes, considerados críticos e semicríticos, como unidades de internação, centro cirúrgico, Unidades de Terapia Intensiva, entre outros, a empresa Skyfactory colaborou com um estudo pioneiro em neuroarquitetura, liderado pelo Departamento de Design e pela Faculdade de Ciências Humanas da Texas Tech University. Debajyoti (2015, p.1) examinou como a inserção da natureza simulada, na forma de composições fotográficas do céu montadas no teto, influenciava os resultados dos pacientes. Estudos anteriores mostravam que a natureza tem uma influência positiva nos pacientes, porém tinham como referência quadros com representações da natureza, não simulação realística. Nesse experimento, foram colocadas, em cinco quartos, luminárias de teto como uma claraboia projetada com imagem realística e, em outros cinco não havia intervenção. Foram coletados dados de 181 pacientes em 11 resultados. Percebeu-se satisfação ambiental 12% maior e redução do nível de estresse e ansiedade de 53,4% e 34,79%, respectivamente, no grupo com acesso às imagens. Abaixo, na imagem 5, há um exemplo de como aplicar essas placas no teto em leito de UTI, uma vez que o paciente está deitado, de costas para a janela, com monitoramento frontal pela enfermagem, com a possibilidade de visualizar a natureza e ter noção de que é dia. À noite, a placa é desligada, as luzes ficam mais indiretas e com temperatura de cor mais amarela, sem o espectro da luz azul, colaborando para o sono do paciente e a restauração da sua saúde.

Imagem 5. Leito de UTI. Fonte: Imagem produzida pela autora (2021).

4.2. Audição

?A percepção do som envolve estruturas cerebrais, tais como córtex préfrontal, córtex pré-motor, córtex motor, córtex somatosensorial, lobos temporais, córtex parietal, córtex occipital, cerebelo, sistema límbico, incluindo a amígdala e o tálamo? (OVERY; MOLNAR-SZACKACS, 2009 apud ROCHA, 2013, p. 133).

Para Tuan (1980, p.10), a audição não é muito desenvolvida nos seres humanos e nos primatas. Os olhos obtêm informações mais detalhadas e precisas sobre o meio ambiente do que os ouvidos, mas, geralmente, somos mais sensibilizados pelo que ouvimos do que pelo que vemos. Para muitos, a música é a experiência emocional mais forte do que as artes plásticas ou os cenários. Somos mais vulneráveis aos sons, porque não podemos fechar os ouvidos como podemos fazer com os olhos.

O cérebro é capaz de trabalhar em muitas coisas ao mesmo tempo, com sobreposição e paralelismo. É assim que o nosso sistema auditivo processa o som: ele não precisa esperar até descobrir a altura de um som para saber de onde procede [...]. Nosso cérebro está permanentemente atualizando suas opiniões, especialmente quando se trata de perceber estímulos visuais e auditivos, centenas de vezes por segundo, e sequer sabemos disto (LEVITIN, 2021, p. 90). 

Em ambientes de saúde, por exemplo, o som pode influenciar a recuperação do paciente ou interferir na execução do trabalho do profissional de saúde.

NERBASS (2015, p. 108) apresenta uma pesquisa sobre fatores ambientais que prejudicam o sono de paciente em UTI. Um desses fatores é o ruído provocado pelos aparelhos ligados no paciente, conversas paralelas das equipes assistenciais ou visitantes e acompanhantes. O excesso de ruído tem sido considerado o fator mais perturbador do sono na UTI, com efeitos prejudiciais não só sobre a recuperação dos pacientes, mas também sobre a saúde dos profissionais.

O conceito predominante de unidade de terapia intensiva, por exemplo, são leitos dispostos em salão, separados por cortina, para se ter uma melhor visualização do paciente. Porém este modelo tem se mostrado muito ineficiente em relação ao conforto acústico. Um novo conceito que tem sido adotado são os leitos fechados com vidro, permitindo visualização do paciente e garantindo um nível de ruído mais adequado, como pode ser visto na imagem 6.


Imagem 6. Leitos de UTI. Fonte: Imagem produzida pela autora (2021).


Bittencourt (2021, p.14) descreve alternativas para se reduzir o ruído dentro das UTIs, como: substituir os alarmes acústicos por visuais, distinguir os alarmes para priorizar o de ameaça à vida, aferir o nível acústico periodicamente e mostrar à equipe pesquisas sobre o assunto, conscientizando-a sobre os possíveis efeitos negativos do excesso de ruído.

Em contrapartida a presença de música nesses ambientes tem se mostrado, por meio de estudos científicos, benéfica para o paciente em UTI, por exemplo.

De acordo com a pesquisa de JUNIOR (2018, p.6), há evidências da redução dos sintomas de desconforto, aumento de sensações positivas, facilitação da comunicação pessoal e interpessoal, maior sociabilidade, redução de dores físicas e mentais, mu¬danças benéficas em padrões fisiológicos e de estímulo corporal com o uso da musicoterapia. Dos 35 estudos analisados por ele, 14,5% apontam que a música auxilia na redução da ansiedade; 31,7% recomendam o uso da música como intervenção da enfermagem; 18,4% concluem que a música atua nas respostas fisiológicas; 12,4% referem-se à música como alternativa viável para uso sedativo e ansiolítico; e 17,9% concluem que a música auxilia na redução da dor. Contudo, 3,2% registram que não houve resultados significativos para os clientes quanto à utilização da música.

A partir do final do século XX, o Ministério da Saúde estabeleceu estratégias importantes de conforto na Política Nacional de Humanização da Atenção e Gestão no Sistema Único de Saúde ? Humaniza SUS. Dentre as recomendações para ambiências humanizadas, o ruído tem abordagem destacada, e propõe-se ?a utilização de música ambiente em alguns espaços, como enfermarias e esperas. Em outro âmbito, é importante considerar também a proteção acústica que garanta a privacidade e o controle de alguns ruídos? (BRASIL, 2010, p. 122).

Uma medida de humanização para os pacientes internados refere-se ao uso da música de modo individual, utilizando fones de ouvidos descartáveis. Solução para o conforto aos pacientes recomendada por estudos científicos e por profissionais que lidam com o componente de conforto acústico. Essa medida tem apresentado resultados ?que podem regular o humor, reduzir a agressividade e a depressão? justificada porque o ?processo de audição musical afeta de forma positiva a liberação de substâncias químicas cerebrais? (ARAÚJO, 2013:1319APUD BITTENCOURT, 2021, p. 13).

Os materiais de acabamento também devem ser considerados como estratégia para reduzir o ruído. Existem normas que regulamentam o nível de ruído dentro dos ambientes construídos. Uma delas é a NBR 10.152, que regula os níveis de ruído para conforto acústico, cujos limites dependem do tipo de ambiente e da atividade executada.

Bittencourt (2021, p.20) cita alguns aspectos projetuais para edificações de saúde, a fim de auxiliar na diminuição de ruído, tais como: estabelecer a adequada seleção do terreno e a devida consideração sobre os aspectos ambientais que possam impactar no conforto acústico; avaliar o impacto das condições naturais, relevo, topografia e condições geológicas na implantação da edificação, escolher e definir a forma do edifício e sua relação com as demais edificações do entorno imediato, ordenar e distribuir os espaços internos, considerando fluxos e relações funcionais, estabelecer a distribuição espacial e a adequação da forma interna da edificação, definir a utilização das soluções de construção que reduzam a transmissibilidade dos ruídos, definir e aplicar materiais que reduzam a reverberação e absorção dos ruídos, utilizar e aplicar detalhes construtivos que contribuam para melhor qualidade acústica.

4.3. Olfato

Segundo BARBEITOS (2010, p.2), a partir da sensação, o odor é memorizado num processo de aprendizado, sendo importante na seleção alimentar e em processos e experiências emocionais. O aprendizado olfativo está relacionado diretamente às experiências individuais e as coletivas, podendo alterar estados afetivos e relacionamento quanto ao comportamento social e sexual. Assim, memórias evocadas por meio de odores são distintas de outras, em razão da sua grande potência emocional. 

NANDA (2005, p.60) descreve que o sentido do olfato registra variações no odor dentro de uma faixa limitada. Nas distâncias de aproximadamente um metro é possível sentir odores mais íntimos, como cheiro do cabelo, da pele, da roupa. Perfumes e outros odores mais fortes podem ser percebidos de dois a três metros. Cheiros mais fétidos, como peixe podre, podem ser percebidos a distâncias mais longas.

Esses conceitos trazem reflexões de quão importante é o estímulo do olfato dentro dos ambientes. O quanto ele pode interferir no bem-estar do usuário, considerando memórias afetivas, odores agradáveis e desagradáveis.

Em ambientes hospitalares, segundo WOSNY (2004, p.1), o hospital tem um odor próprio. O ?cheiro de hospital? é indicativo de qualidade em saúde e, principalmente, de condições de risco de infecção hospitalar.

Cheiros como os de remédio, ?comida de hospital?, desinfetante, são recorrentes nas falas de quem permanece no hospital, seja para uma consulta eletiva, seja para uma internação mais prolongada.

Todo odor comunica algo. Agradáveis ou desagradáveis, os odores enviam alguma mensagem, óbvias em diversas situações, em outras, requerendo decodificação. Podem significar algum perigo iminente presente no ambiente, causa ou resultado de algum dano ou desconforto ao indivíduo. A interpretação destas mensagens olfativas pela enfermagem, dependendo da sua resposta, pode ser decisiva na condução e desenlace do ato de cuidar mediado pela relação percepção olfativa/ação de Enfermagem. Pode ser sugestiva de emanação fisiológica resultante da ação de determinada patologia portada pelo cliente. A percepção olfativa, mais aguçada em uns e menos em outros, responde às sensações variadas. A maior compreensão estético/filosófica e técnico/científica das emanações odorantes, poderão favorecer no diagnóstico de Enfermagem e planejamento da assistência, vigilância da qualidade ambiental e terapêutica (WOSNY, 2004, p. 1),

Alguns cuidados devem ser tomados ao projetar ambientes hospitalares, como a escolha de materiais de acabamentos inodoros, local onde os produtos e medicamentos são manipulados e localização da produção da cozinha distante dos pacientes, para não impactar de forma negativa o bem-estar de seus usuários.

Utilizando estratégias de biofilia, tema citado em capítulo anterior, a natureza se conecta de forma positiva com o homem reduzindo dor, estresse e ansiedade. Portanto, aromas da natureza para os ambientes hospitalares podem ajudar na restauração dos pacientes e no bem-estar dos profissionais de saúde. Essa estratégia pode ser utilizada por meio de aromatizadores elétricos com óleos essenciais.

4.4. Paladar

O paladar ou a gustação é um sentido químico, ou seja, que depende de quimiorreceptores (receptores sensoriais que transformam energia química em elétrica). Temos esses receptores químicos presentes em diferentes partes da língua e que são sensíveis a cinco tipos específicos de substâncias: há receptores diferentes para doce, amargo, ácido, salgado e umami. Esse último, apesar do nome esquisito, é estimulado por algo que conhecemos bem, o sabor do glutamato monossódico, o chamado realçador do paladar. Esses receptores de umami, quando estimulados, dão ao alimento a sensação de saboroso e agradável. Com esses cinco receptores, somos capazes de identificar os mais variados sabores nos alimentos e nos deliciar com as mais fantásticas guloseimas (TIEPPO, 2019, p. 129).

No âmbito hospitalar, são diferentes os usuários que recebem alimentação todos os dias. Funcionários, alunos, acompanhantes e pacientes se alimentam diariamente no hospital. Os pacientes recebem até cinco refeições diárias. Como trazer essa experiência de forma positiva, de maneira a auxiliar no processo de recuperação?

O acesso a uma variedade de alimentos seguros e saudáveis é um direito humano fundamental. O cuidado nutricional adequado, incluindo a qualidade da alimentação, tem efeitos benéficos na recuperação dos pacientes e na sua qualidade de vida. A apresentação da refeição, a variedade de produtos e o local físico são os fatores primários que contribuem para a percepção negativa do usuário e para atitudes em relação às refeições de instituições. Geralmente, o público observa os hospitais como instituições, tendo a visão de que elas são menos favorecidas em recursos. A imagem negativa da refeição hospitalar é generalizada e, portanto, não necessariamente relacionada aos alimentos por si só (GARCIA, 2010, p. 474).

Para Hesse (2016, p.53), os hospitais, na última década, viram uma oportunidade de aprimorar o atendimento ao paciente, além de proporcionar um diferencial competitivo e como forma de redução de custos. No hospital, a nutrição trabalha de forma integrada e considera as limitações de cada paciente em relação ao seu estado clínico. Para ele, a refeição deve ser apresentada de forma agradável, para suscitar a vontade de comer. Nos cinco artigos estudados por Hesse, o tempo de internação e os cardápios bem-planejados são citados como determinantes na aceitação da refeição hospitalar.

O paciente internado, seja no leito de UTI, seja no de internação, recebe sua alimentação na cama, muitas vezes numa mesa alta, sem muita ergonomia, ou em uma bancada de refeição. O ambiente onde ele passa o dia não estimula de forma satisfatória a gustação. Por isso, a importância de melhorar essa experiência por meio de uma boa apresentação da refeição, estimulando mais de um sentido.

Os funcionários do hospital ou mesmo os acompanhantes que fazem suas refeições em refeitórios também precisam de espaços adequados, com revestimentos que absorvam os ruídos, com presença de natureza viva ou simulada, com cores e estímulos que tornem a experiência agradável e prazerosa, como podemos ver na imagem 7.

Imagem 7. Refeitório de Hospital. Fonte: Imagem produzida pela autora (2022).

Um bom ambiente sensorial não é aquele que agride todos os sentidos, mas que cria uma conversa envolvente dentro deles. É um passo inicial para além da estética da aparência, em direção à estética da experiência (NANDA, 2005, p.164).

4.5. Tato

?O órgão responsável pelo tato é o maior órgão do corpo humano: a pele. Os mecanismos responsáveis pelo tato estão na segunda camada da pele, a derme. O tato é o primeiro sentido a se desenvolver no embrião humano? (Pacievitch, 2013, p. 1).

Tieppo (2019, p.117) traz o conceito de tato acompanhado da sensibilidade. Quando tocamos algo, experienciamos não apenas o toque, mas também sensações, como cócegas, pressão, vibração ou movimento, temperatura, dor e posição das partes do corpo.

O tato está relacionado ao desenvolvimento e à adaptação humana. É tocando nas coisas que o bebê começa a identificar os diferentes formatos e texturas dos objetos. Ele também passa a entender o próprio corpo e a diferenciar as pessoas. As pessoas com deficiência visual, por meio do tato e da propriocepção, utilizam as pontas dos dedos para ?ler? os relevos de uma superfície e se orientar no espaço.

Em projetos de ambientes hospitalares, deve-se levar em consideração a experiência do tato para priorizar a leitura espacial pelo braile, utilizar diferentes materiais de acabamento e mobiliário para identificar a característica do local e agregar outras sensações do sistema somatossensorial, como temperatura adequada do ambiente, por meio de ventilação natural ou artificial.

5. Conclusão

O estudo da neurociência aplicada à arquitetura traz aspectos importantes ao processo de projeto que vão além da estética e priorizam a melhor experiência do usuário. O principal aspecto estudado neste artigo foi o estímulo dos sentidos, via de acesso ao nosso sistema nervoso, por meio da visão, do olfato, da audição, do paladar e do tato, assim como o impacto positivo ou negativo na qualidade de vida das pessoas. Nosso sistema nervoso capta os estímulos desses ambientes e os transmite para o nosso corpo por meio das células receptoras, provocando sensações, emoções e moldando nosso comportamento. Este trabalho trouxe reflexões de como o ambiente construído pode afetar nosso cérebro e impactar a vida das pessoas com foco em ambientes de saúde e de como aplicar estratégias ambientais que estimulem os sentidos, tais como: biofilia, iluminação e conforto acústico. Assim, foi apresentado: como a biofilia pode ser aplicada por meio da presença de paisagens vivas ou simuladas, texturas e aromas, podendo reduzir o tempo de internação dos pacientes, o uso de medicamentos e o estresse dos profissionais de saúde; como a iluminação, natural ou artificial, regula o relógio biológico do ser humano e, quando aplicada de forma adequada, auxilia na produção de melatonina durante a noite e no foco e na concentração durante o dia; e como o conforto acústico contribui para que se tenha uma recuperação mais efetiva ou um trabalho com maior foco e concentração. Os estudos da neuroarquitetura e os futuros avanços da neurociência podem contribuir para melhorar o design dos edifícios, para deixá-los mais atrativos e melhorar a saúde e o bem-estar dos seus usuários. 

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